professor Nelson Nery Junior,
mestre emDireito pela PUC/SP,
doutor em Direito Processual
Leiam, entendam, apliquem e depois critiquem
O
Civil pela Universidade Friedrich-
Alexander, de Erlangen-Nürberg,Ale-
manha, concedeu a entrevista abaixo
para o
“
Ambiente Legal”
,
onde faz
uma avaliação positiva do novo Códi-
go Civil Brasileiro. Embora diga que
“
toda crítica merece ser levada em con-
sideração para o aprimoramento de
uma lei da magnitude de um Código
Civil”, ele também acha que primeiro
é necessário que “o leiam, depois que
o entendam, apliquem, e só depois
desse processo, bastante complexo, é
que se poderia fazer as críticas”. Au-
tor entre outras publicações, do livro
“
Novo Código Civil e Legislação Civil
Extravagante em Vigor”
,
da editora
RT, Nelson Nery é professor de
Direito Processual Civil da Faculdade
de Direito da PUC/SP e professor co-
ordenador dos Cursos de Mestrado e
Doutorado, da área de Direitos Hu-
manos, Difusos e Coletivos e do Cur-
so de Especialização de Direito Con-
tratual. A sua entrevista é uma contri-
buição importante para o esclareci-
mento de muitos aspectos relativos ao
novo Código Civil.
Ambiente Legal – De um modo
geral, como o senhor avalia o novo
Código Civil brasileiro?
Nelson Nery –
Minha avaliação é
positiva. Evidentemente toda crítica
merece ser levada em consideração
para o aprimoramento de uma lei da
magnitude de um Código Civil, que é
a “Constituição do Cidadão”. Na ver-
dade, é necessário, primeiro, que
leiam o novo Código Civil. Depois,
que o entendam, em seguida, que o
apliquem. Somente depois de realiza-
do esse processo, que é bastante com-
plexo, é que se poderia fazer as críti-
cas sobre o que está errado (desde
logo), o que deu errado (na aplicação)
e o que precisará ser modificado. Críti-
ca feita antes da conclusão desse pro-
cesso soa como leviana. Muita gente
não leu e, se leu, não entendeu o Có-
digo Civil. Mesmo assim se arvoram
no direito de criticar, com ares de de-
finitividade, como se o Código Civil
tivesse sido elaborado por quem não
tinha nenhum compromisso com a
ciência e a cidadania. Louvo as críti-
cas construtivas e bem elaboradas, o
que se percebe quando seu autor
demonstra conhecimento do sistema
do Novo Código Civil. Isso, porém,
ocorre em pou-
quíssimos ca-
sos. O Código
Civil é moder-
no. Basta que o
intérprete e o
aplicador, que
já o entendeu,
dê a ele a inter-
pretação e apli-
cação que a ci-
dadania quer e
merece.
AL – Quais
são os maiores
méritos desta
nova lei bra-
sileira?
N e l s o n
Nery -
O de
fazer com que
seja possível a
conscientiza-
ção do povo
brasileiro, de que tem um estatuto do
cidadão, uma lei que regula toda a sua
vida em sociedade, em relação às suas
empresas e em relação ao seu seme-
lhante. Será necessário que o povo seja
educado para ser informado da exis-
tência de seus direitos enquanto ci-
dadão que se relaciona com outros ci-
dadãos e empresas. Outro mérito é o
de haver sido elaborado com técnica
legislativa diferenciada, à base de
Cláusulas Gerais e de Conceitos
Legais Indeterminados,
merecendo
destaque a “função social da pro-
priedade”, a “função social da empre-
sa”, a “função social do contrato”, a
cláusula geral de “boa-fé objetiva”,
bem como a “responsabilidade civil
objetiva” nos casos que enumera. Há,
ainda, entre outros méritos, a criação
do instituto da desapropriação judicial
pela “posse –trabalho”, como circuns-
tância decorrente da função social da
propriedade; a inclusão do cônjuge
como herdeiro que concorre à herança
juntamente com os filhos; o tratamen-
to jurídico do regime de casamento da
comunhão dos bens aqüestos; a modi-
ficação do re-
gime jurídico
do negócio
simulado, de
anulável (CC
de 1916) para
nulo (CC de
2002);
a in-
clusão da lesão
e do estado de
perigo como
vícios do ato e
negócio jurídi-
co. Mas só as
c l á u s u l a s
gerais da fun-
ção social da
propriedade,
do contrato e
da empresa,
bem como a da
boa-fé objeti-
va, já seriam
novidades su-
ficientes para demonstrar a contempo-
raneidade e avanço do novo Código
Civil.
AL – Existe algum pecado grave
na chamada “Lei do Cidadão”?
Como saná-lo?
Nelson Nery –
Depende da ótica
pela qual você o observa. Não vejo
pecados “graves” no novo Código Ci-
vil. Elaborado por comissão de juris-
tas de alta capacitação técnica, não se
pode dizer que tenha incorrido em pe-
cados mortais. Às vezes se observa um
viés conservador, o que é absoluta-
mente normal em comissão colegia-
da. Outras vezes há modernidades in-
críveis, como as várias “funções so-
setembro a novembro de 2002
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A recomendação do professor Nelson Nery Júnior é na verdade um alerta.
Uma obra com a magnitude do Código Civil brasileiro não pode
ser alvo de críticas apressadas.
Nelson Nery:
O código é moderno.